quinta-feira, 30 de agosto de 2012

Constantina “A Esmagadora”


"A rocha, a enorme rocha três vezes desventrada pela torrente infatigável que se enterrava em batimentos sonoros, escavando obstinadamente o triplo inferno com a sua força perdida, fora do leito sempre desfeito, sem longevidade suficiente para chegar ao seu sepulcro de blocos derrubados: cemitério destruído onde a torrente nunca viera entregar a alma, reanimada muito mais acima em cascatas inextinguíveis, afundadas em funil, as únicas visíveis das duas pontes lançadas sobre o Kudia, da ravina onde o uede não passava de um ruído de queda repercutido na sucessão de abismos, ruído de águas que nenhuma caldeira ou bacia continha, sussurro surdo sem fim, sem origem, cobrindo o estrondo furioso da máquina cuja velocidade decrescia contudo, atravessando restos de verdura, pradarias ainda interditas ao gado, irradiadas sob a ligeira crosta de gelo, florestas de figueiras nuas e disformes, de alfarrobeiras, de cepas em desuso, de laranjais rectilíneos, destacamentos de romanzeiras, de acácias, de nogueiras, ravinas de nespereiras e de carvalhos até à proximidade do caos brumoso e maciço (...).”

Kateb Yacine
Nedjma (Tricontinental Editora, 1987)